Tinta que conduz eletricidade; uma janela que muda de transparente para opaca ao toque de um botão; uma gelatina que faz música. Todas essas...
Tinta que conduz eletricidade; uma janela que muda de transparente para opaca ao toque de um botão; uma gelatina que faz música. Todas essas coisas existem, e Catarina Mota diz: é tempo de brincarmos com isso. (TED Talks)
Eu tenho um amigo em Portugal cujo avô construiu um veículo com uma bicicleta e uma máquina de lavar para que pudesse transportar a sua família. Ele fê-lo porque não conseguia comprar um carro, mas também porque sabia como o fazer. Houve um tempo em que entendíamos como as coisas funcionavam e como eram feitas, para as podermos construir e consertar ou, no mínimo, tomar decisões conscientes sobre o que comprar. Muitas dessas práticas "faça você mesmo" foram perdidas na segunda metade do século XX. Mas agora, a comunidade de criadores e o modelo open-source estão a trazer de volta às nossas vidas esse tipo de conhecimento sobre como as coisas funcionam e do que são feitas, e eu acredito que precisamos de as levar ao próximo nível, aos componentes dos quais as coisas são feitas.
Na maior parte, ainda sabemos de que são feitos materiais tradicionais como o papel e os têxteis e como são produzidos. Mas hoje temos esses compostos incríveis, futuristas — plásticos que mudam de forma, tintas que conduzem eletricidade, pigmentos que mudam de cor, tecidos que se iluminam. Vou mostrar-vos alguns exemplos.
Então, a tinta condutora permite que pintemos circuitos ao invés de usarmos as tradicionais placas de circuitos impressos, ou fios. No caso deste pequeno exemplo que estou a segurar, usámo-la para criar um sensor de toque que reage à minha pele acendendo esta pequena luz. A tinta condutora tem sido usada por artistas, mas descobertas recentes indicam que em breve poderemos usá-la em impressoras a laser e canetas. E esta é uma folha de acrílico infundida com partículas incolores de difusão de luz. Isso significa que, enquanto o acrílico comum difunde apenas a luz nas margens, este ilumina toda a superfície quando eu acendo as luzes ao seu redor. Duas das aplicações conhecidas para este material incluem o design de interiores e os sistemas multitácteis. ...e pigmentos termocrómicos que mudam de cor a uma determinada temperatura. Vou colocar isto num prato quente que está ajustado a uma temperatura levemente mais alta que a ambiente e vocês podem ver o que acontece. Uma das aplicações iniciais para este material é, entre outras coisas, em biberões, para indicar quando o conteúdo está suficientemente arrefecido para se beber.
Estes são apenas alguns dos materiais conhecidos como materiais inteligentes. Daqui a alguns anos, estarão em muitos dos objetos e tecnologias que usamos diariamente. Podemos ainda não ter os carros voadores que a ficção científica nos prometeu, mas podemos ter paredes que mudam de cor dependendo da temperatura, teclados que podem ser enrolados, e janelas que se tornam opacas ao apertar de um botão.
Eu sou uma cientista social na prática, então por que razão estou aqui hoje a falar sobre materiais inteligentes? Bem, primeiramente, porque sou uma criadora. Sou curiosa sobre como as coisas funcionam e como são feitas, mas também porque acredito que devemos ter uma compreensão mais profunda sobre os componentes que constituem o nosso mundo, e neste momento, não sabemos o suficiente sobre estes compostos de alta tecnologia dos quais o nosso futuro será feito. É difícil obter materiais inteligentes em pequenas quantidades. Há pouquíssima informação disponível sobre como os usar, e muito pouco é dito sobre como são produzidos. Então, neste momento, eles existem muito mais neste reino de segredos comerciais e patentes a que somente universidades e grandes empresas têm acesso.
Há um pouco mais de três anos atrás, Kirsty Boyle e eu começámos um projeto a que chamámos Open Materials. É um website onde nós, e quem mais se quiser juntar a nós, partilhamos experiências, publicamos informações, encorajamos outros a contribuir sempre que puderem, e agregamos recursos como artigos de pesquisa e tutoriais de outros criadores como nós. Nós gostaríamos que isto se tornasse um grande banco de dados gerado coletivamente de informações "faça você mesmo" sobre materiais inteligentes.
Mas por que motivo nos deveríamos importar com a maneira como os materiais inteligentes funcionam e do que são feitos? Em primeiro lugar, porque não podemos moldar o que não compreendemos, e o que não compreendemos e usamos acaba por nos moldar a nós. Os objetos que usamos, as roupas que vestimos, as casas em que vivemos, tudo tem um impacto profundo no nosso comportamento, saúde e qualidade de vida. Então, se vamos viver num mundo feito de materiais inteligentes, devemos conhecê-los e entendê-los. Em segundo lugar, e igualmente importante, a inovação tem sido sempre alimentada por amadores. Tantas vezes, amadores, não especialistas, foram os inventores e aperfeiçoadores de coisas que vão desde bicicletas de montanha a semicondutores, computadores pessoais, aviões.
O maior desafio é que a ciência dos materiais é complexa e requer equipamentos caros. Mas nem sempre é esse o caso. Dois cientistas na Universidade de Illinois entenderam isso quando publicaram um artigo sobre um método mais simples de fazer tinta condutora. Jordan Bunker, que, até então, não tinha nenhuma experiência em química, leu esse artigo e reproduziu a experiência no seu espaço de criação, usando apenas substâncias disponíveis para compra e ferramentas. Ele usou um forno elétrico, e até fez o seu próprio misturador de vórtice, baseado num tutorial de outro cientista/criador. Jordan depois publicou os seus resultados online, incluindo todas as coisas que tentou fazer e não funcionaram, para que outros pudessem estudar e reproduzir. Assim, a principal forma de inovação de Jordan foi pegar numa experiência criada num laboratório bem equipado na universidade e recriá-la numa garagem em Chicago usando somente materiais baratos e ferramentas feitas por ele mesmo. E agora que ele publicou o seu trabalho, outros podem continuar onde ele parou e desenvolver processos e melhorias ainda mais simples.
Outro exemplo que eu gostaria de mencionar é o Kit-of-No-Parts de Hannah Perner-Wilson. O objetivo de seu projeto é destacar as qualidades expressivas dos materiais enquanto se concentra na criatividade e competências do construtor. Os kits eletrónicos são muito poderosos por nos ensinarem como as coisas funcionam, mas as restrições inerentes ao seu design influenciam o modo como aprendemos. Assim, a abordagem de Hanna, por outro lado, é formular uma série de técnicas para criar objetos incomuns que nos libertem de restrições preestabelecidas ao ensinar-nos sobre os materiais em si. Entre as muitas experiências impressionantes de Hanna, esta é uma das minhas preferidas. ["Caixas de som de papel"] O que vemos aqui é só um pedaço de papel com uma fita de cobre, ligado a um leitor de MP3 e a um íman. (Música: "Happy Together") Com base na pesquisa de Marcelo Coelho do MIT, Hannah criou uma série de caixas de som de papel a partir de uma ampla variedade de materiais desde simples fitas de cobre a tecidos e tintas condutoras. Assim como Jordan e tantos outros criadores, Hannah publicou as suas receitas e permite que qualquer um as copie e reproduza.
Mas a eletrónica em papel é um dos mais promissores ramos da ciência de materiais, porque nos permite criar eletrónica mais barata e flexível. Assim, o trabalho artesanal de Hannah, e o facto de ela ter partilhado as suas descobertas, abre as portas a uma série de novas possibilidades que são esteticamente apelativas e inovadoras ao mesmo tempo.
O interessante sobre os criadores é que nós criamos por paixão e curiosidade, e não temos medo de fracassar. Com frequência, enfrentamos os problemas a partir de ângulos não convencionais e, no processo, acabamos por descobrir alternativas ou até formas melhores de se fazerem as coisas. Quanto mais pessoas experimentarem com materiais, quanto mais pesquisadores estiverem dispostos a partilhar as suas pesquisas, e fabricantes o seu conhecimento, melhores hipóteses teremos de criar tecnologias que nos sirvam verdadeiramente a todos nós.
Eu sinto-me um pouco como Ted Nelson se deve ter sentido quando, no início dos anos '70, escreveu "Você [pode e] deve entender os computadores agora." Na época, os computadores eram grandes máquinas com as quais só os cientistas se importavam, e ninguém sequer sonhava em ter um em casa. Por isso, é um pouco estranho eu estar aqui em pé a dizer: "Vocês [podem e] devem entender os materiais inteligentes agora." Apenas tenham em mente que adquirir um conhecimento preferencial sobre as tecnologias emergentes é a melhor maneira de assegurar que teremos uma palavra a dizer na construção do nosso futuro.
Obrigada.
(Aplausos)
[Via BBA]
Eu tenho um amigo em Portugal cujo avô construiu um veículo com uma bicicleta e uma máquina de lavar para que pudesse transportar a sua família. Ele fê-lo porque não conseguia comprar um carro, mas também porque sabia como o fazer. Houve um tempo em que entendíamos como as coisas funcionavam e como eram feitas, para as podermos construir e consertar ou, no mínimo, tomar decisões conscientes sobre o que comprar. Muitas dessas práticas "faça você mesmo" foram perdidas na segunda metade do século XX. Mas agora, a comunidade de criadores e o modelo open-source estão a trazer de volta às nossas vidas esse tipo de conhecimento sobre como as coisas funcionam e do que são feitas, e eu acredito que precisamos de as levar ao próximo nível, aos componentes dos quais as coisas são feitas.
Na maior parte, ainda sabemos de que são feitos materiais tradicionais como o papel e os têxteis e como são produzidos. Mas hoje temos esses compostos incríveis, futuristas — plásticos que mudam de forma, tintas que conduzem eletricidade, pigmentos que mudam de cor, tecidos que se iluminam. Vou mostrar-vos alguns exemplos.
Então, a tinta condutora permite que pintemos circuitos ao invés de usarmos as tradicionais placas de circuitos impressos, ou fios. No caso deste pequeno exemplo que estou a segurar, usámo-la para criar um sensor de toque que reage à minha pele acendendo esta pequena luz. A tinta condutora tem sido usada por artistas, mas descobertas recentes indicam que em breve poderemos usá-la em impressoras a laser e canetas. E esta é uma folha de acrílico infundida com partículas incolores de difusão de luz. Isso significa que, enquanto o acrílico comum difunde apenas a luz nas margens, este ilumina toda a superfície quando eu acendo as luzes ao seu redor. Duas das aplicações conhecidas para este material incluem o design de interiores e os sistemas multitácteis. ...e pigmentos termocrómicos que mudam de cor a uma determinada temperatura. Vou colocar isto num prato quente que está ajustado a uma temperatura levemente mais alta que a ambiente e vocês podem ver o que acontece. Uma das aplicações iniciais para este material é, entre outras coisas, em biberões, para indicar quando o conteúdo está suficientemente arrefecido para se beber.
Estes são apenas alguns dos materiais conhecidos como materiais inteligentes. Daqui a alguns anos, estarão em muitos dos objetos e tecnologias que usamos diariamente. Podemos ainda não ter os carros voadores que a ficção científica nos prometeu, mas podemos ter paredes que mudam de cor dependendo da temperatura, teclados que podem ser enrolados, e janelas que se tornam opacas ao apertar de um botão.
Eu sou uma cientista social na prática, então por que razão estou aqui hoje a falar sobre materiais inteligentes? Bem, primeiramente, porque sou uma criadora. Sou curiosa sobre como as coisas funcionam e como são feitas, mas também porque acredito que devemos ter uma compreensão mais profunda sobre os componentes que constituem o nosso mundo, e neste momento, não sabemos o suficiente sobre estes compostos de alta tecnologia dos quais o nosso futuro será feito. É difícil obter materiais inteligentes em pequenas quantidades. Há pouquíssima informação disponível sobre como os usar, e muito pouco é dito sobre como são produzidos. Então, neste momento, eles existem muito mais neste reino de segredos comerciais e patentes a que somente universidades e grandes empresas têm acesso.
Há um pouco mais de três anos atrás, Kirsty Boyle e eu começámos um projeto a que chamámos Open Materials. É um website onde nós, e quem mais se quiser juntar a nós, partilhamos experiências, publicamos informações, encorajamos outros a contribuir sempre que puderem, e agregamos recursos como artigos de pesquisa e tutoriais de outros criadores como nós. Nós gostaríamos que isto se tornasse um grande banco de dados gerado coletivamente de informações "faça você mesmo" sobre materiais inteligentes.
Mas por que motivo nos deveríamos importar com a maneira como os materiais inteligentes funcionam e do que são feitos? Em primeiro lugar, porque não podemos moldar o que não compreendemos, e o que não compreendemos e usamos acaba por nos moldar a nós. Os objetos que usamos, as roupas que vestimos, as casas em que vivemos, tudo tem um impacto profundo no nosso comportamento, saúde e qualidade de vida. Então, se vamos viver num mundo feito de materiais inteligentes, devemos conhecê-los e entendê-los. Em segundo lugar, e igualmente importante, a inovação tem sido sempre alimentada por amadores. Tantas vezes, amadores, não especialistas, foram os inventores e aperfeiçoadores de coisas que vão desde bicicletas de montanha a semicondutores, computadores pessoais, aviões.
O maior desafio é que a ciência dos materiais é complexa e requer equipamentos caros. Mas nem sempre é esse o caso. Dois cientistas na Universidade de Illinois entenderam isso quando publicaram um artigo sobre um método mais simples de fazer tinta condutora. Jordan Bunker, que, até então, não tinha nenhuma experiência em química, leu esse artigo e reproduziu a experiência no seu espaço de criação, usando apenas substâncias disponíveis para compra e ferramentas. Ele usou um forno elétrico, e até fez o seu próprio misturador de vórtice, baseado num tutorial de outro cientista/criador. Jordan depois publicou os seus resultados online, incluindo todas as coisas que tentou fazer e não funcionaram, para que outros pudessem estudar e reproduzir. Assim, a principal forma de inovação de Jordan foi pegar numa experiência criada num laboratório bem equipado na universidade e recriá-la numa garagem em Chicago usando somente materiais baratos e ferramentas feitas por ele mesmo. E agora que ele publicou o seu trabalho, outros podem continuar onde ele parou e desenvolver processos e melhorias ainda mais simples.
Outro exemplo que eu gostaria de mencionar é o Kit-of-No-Parts de Hannah Perner-Wilson. O objetivo de seu projeto é destacar as qualidades expressivas dos materiais enquanto se concentra na criatividade e competências do construtor. Os kits eletrónicos são muito poderosos por nos ensinarem como as coisas funcionam, mas as restrições inerentes ao seu design influenciam o modo como aprendemos. Assim, a abordagem de Hanna, por outro lado, é formular uma série de técnicas para criar objetos incomuns que nos libertem de restrições preestabelecidas ao ensinar-nos sobre os materiais em si. Entre as muitas experiências impressionantes de Hanna, esta é uma das minhas preferidas. ["Caixas de som de papel"] O que vemos aqui é só um pedaço de papel com uma fita de cobre, ligado a um leitor de MP3 e a um íman. (Música: "Happy Together") Com base na pesquisa de Marcelo Coelho do MIT, Hannah criou uma série de caixas de som de papel a partir de uma ampla variedade de materiais desde simples fitas de cobre a tecidos e tintas condutoras. Assim como Jordan e tantos outros criadores, Hannah publicou as suas receitas e permite que qualquer um as copie e reproduza.
Mas a eletrónica em papel é um dos mais promissores ramos da ciência de materiais, porque nos permite criar eletrónica mais barata e flexível. Assim, o trabalho artesanal de Hannah, e o facto de ela ter partilhado as suas descobertas, abre as portas a uma série de novas possibilidades que são esteticamente apelativas e inovadoras ao mesmo tempo.
O interessante sobre os criadores é que nós criamos por paixão e curiosidade, e não temos medo de fracassar. Com frequência, enfrentamos os problemas a partir de ângulos não convencionais e, no processo, acabamos por descobrir alternativas ou até formas melhores de se fazerem as coisas. Quanto mais pessoas experimentarem com materiais, quanto mais pesquisadores estiverem dispostos a partilhar as suas pesquisas, e fabricantes o seu conhecimento, melhores hipóteses teremos de criar tecnologias que nos sirvam verdadeiramente a todos nós.
Eu sinto-me um pouco como Ted Nelson se deve ter sentido quando, no início dos anos '70, escreveu "Você [pode e] deve entender os computadores agora." Na época, os computadores eram grandes máquinas com as quais só os cientistas se importavam, e ninguém sequer sonhava em ter um em casa. Por isso, é um pouco estranho eu estar aqui em pé a dizer: "Vocês [podem e] devem entender os materiais inteligentes agora." Apenas tenham em mente que adquirir um conhecimento preferencial sobre as tecnologias emergentes é a melhor maneira de assegurar que teremos uma palavra a dizer na construção do nosso futuro.
Obrigada.
(Aplausos)
[Via BBA]